O QUE INCHA, DESINCHA E AMANHÃ PASSA.
"EU NÃO MANDO FAZER. EU FAÇO OS TREINOS PRATICAMENTE TODOS COM OS MEUS ALUNOS!"
O Método
Qual é a principal diferença do teu método?
São várias. Desde logo, em Portugal quase ninguém faz o Wai Kru e menos ainda o Muay Boran. Eu sigo ao máximo a maneira tradicional, o Wai Kru, as técnicas de Muay Boran, a nomenclatura...
Depois, não dou treinos de 45 minutos. Isso não dá para nada! Sou muito exigente na parte física de resistência e técnica. Todos os treinos, incluindo dos Kids, são de uma hora. Os adultos são 1h30m. Como a escola fica a 300 metros da praia, dou treinos mistos indoor e outdoor.
Por exemplo, se numa semana estou a dar braços, que é boxe e cotovelos, começo pelo treino de plastrons com 3 a 5 técnicas de resposta e ataque. A outra meia hora de treino, aplico na técnica e os restantes 15 minutos no saco. Depois, fazemos os abdominais e no fim o Wai Kru para que os alunos saiam mais relaxados e baixem a adrenalina.
Finalmente, eu não mando fazer. EU faço os treinos praticamente todos com os meus alunos!
O que é o Muay Boran?
É um dos estilos do Muay Thai tradicional, que é o que eu faço e ensino. A posição de combate é diferente, mais baixa, as posições das mãos são diferentes, usa-se muito o saber ler o adversário para usar os seus golpes contra ele próprio, joelhos...
Com quem é que aprendeste Muay Boran?
Com o meu Grão-Mestre, António Duarte, que é Presidente da AITMA em Portugal, a única associação reconhecida pelo Estado Tailandês. O António é Mestre Honorífico de Grau 15 - há 16 graus - e é Master na Tailândia e em Portugal.
Qual é a tua Graduação?
Khan 10, vermelho. Em Kickboxing, tenho o Dan 1 antigo.
O que achas que as pessoas levam de mais especial ao treinar contigo?
Penso que é a paixão que sinto pelo Muay Thai, pela arte marcial em si. Não só pela luta. A luta foi o que me puxou, mas a filosofia toda, a maneira de estar na vida, o ritual, o respeito... Saberes que podes fazer muito mal a uma pessoa mas ao mesmo tempo não fazeres, controlares-te, só neutralizá-la e em combate diferenciar o que é uma guerra de sobrevivência e aquilo que é um combate, um jogo. Existem regras, existe respeito pelo adversário.
A Filosofia
Qual é o teu sonho para esta Escola?
Quero colocar os meus alunos no TOP10 mundial. Não digo no TOP3 porque ainda agora estou a começar, seria ambicioso, mas sei que tenho potential para criar uma das melhores escolas da Europa. Mais do que os meus títulos, quero que o meu legado seja o meu contributo para o Muay Thai e para a nova geração de campeões.
Ensinas uma arte marcial, uma arte nascida num contexto de guerra, uma arte não só de defesa mas que pode matar. Como treinador, como geres isso?
Às vezes erramos. Às vezes ensinamos coisas a pessoas que não devemos. Já há muito tempo que não ensino certas coisas porque há atletas que têm uma visão pura e dura de combate e não têm uma filosofia da arte marcial em si. Eu posso saber que posso matar-te com um só golpe, mas não o faço. Isso pode ser perigoso e sinto-me responsável por me assegurar que as técnicas são transmitidas da forma mais correta possível e apenas a alunos com o equilíbrio necessário para gerir esse conhecimento.
Gostava de deixar com alguém o legado de tudo o que eu sei. Estou à espera do aluno certo, com respeito pela arte, a quem passar todo o meu conhecimento. Tenho já alguns que prometem...
"QUERO COLOCAR OS MEUS ALUNOS NO TOP 10 MUNDIAL"
A HISTÓRIA
Com que idade é que começaste a treinar Muay Thai?
Aos 16, mas por desporto. A sério, desde os 25 anos.
Não é muito tarde para começar?
Depende da dedicação.
Quantas horas é que é preciso treinar por dia para chegar ao nível da competição?
8 horas. 4 de manhã e 4 à tarde.
Chegaste a Campeão Ibérico sem nunca ter tido um patrocinador. Como conseguias treinar 8 horas por dia?
Com o meu esforço e dedicação. Muitas vezes não conseguia. Treinava consoante o meu trabalho e com o objetivo de arranjar um trabalho que desse para conciliar minimamente com os meus treinos. Houve uma fase que trabalhava por turnos. Uma semana treinava de manhã e corria à noite, na semana seguinte treinava à noite e corria de manhã. E combatia ao fim de semana.
Se não fui melhor quando jogava foi porque tinha uma grande instabilidade na minha vida. Tinha o meu filho comigo, trabalhava e treinava para competir. Foi uma luta constante. Se voltava a repetir? Pelo Muay Thai, sim! Não foi fácil, mas sim.
Ainda és o mais recente Campeão Ibérico de Muay Thai. Como é que isso funciona?
Depende das federações e dos seus regulamentos. Há federações em que és campeão mas que no ano seguinte ou em dois anos o título vai a disputa e tu podes defendê-lo. Ou um promotor pode colocar esse título em disputa.
É verdade que fazes 1000 abdominais por dia ainda?
1200, 1300. Sim, treino quase como se ainda fizesse competição. Faço os treinos praticamente todos com os meus alunos. Já não faço 200 low kicks nem 200 joelhos, mas quase.
Como é que consegues com 41 anos?
Descanso uma hora à tarde, bebo vinho tinto e tenho uma mulher maravilhosa!
Qual a maior dificuldade em ensinar Muay Thai?
As pessoas por vezes não têm paciência. O Muay Thai é uma arte marcial com mãos, cotovelos, pernas, joelhos e ainda tens a parte energética e espiritual. Se não deixares fluir e enquadrar os oito “membros” - duas mãos, duas pernas, dois cotovelos, dois joelhos - no teu corpo e dançar, brincar, jogar com o adversário, torna-se difícil jogar. É um jogo de proximidade onde bates nas articulações, lês a movimentação do adversário e tentas anular ou imobilizar mas tem uma grande diversidade de técnicas. Agarras, pegas, partes, imobilizas…
Partes, como?!
Membros do corpo. Por exemplo, uma cotovelada pode partir-te o crânio.
Nao tinhas medo?
É essa a parte que eu gosto no Muay Thai, essa adrenalina. Tu sabes que a qualquer momento podes levar um high kick na cabeça dado com a tíbia e morreres.
Não tinhas medo não só de morrer mas também de matar alguém?
De matar não, porque não penso em matar os outros. Penso em jogar, em mostrar o que eu sei.
Então havia coisas que evitavas fazer?
Sim, há coisas que eu pelo menos não fazia, embora saiba. Mas também já apanhei atletas maus!
Como é que lidas com as nódoas negras?
Isso é o que lidamos melhor. O que incha, desincha e amanhã passa. Há palavras ditas que são piores do que nódoas negras. Chega a um certo ponto que bater com uma nódoa negra já não dói.
"TINHA O MEU FILHO COMIGO, TRABALHAVA E TREINAVA PARA COMPETIR. ESSA SIM FOI UMA LUTA CONSTANTE."
Muay Thai, uma modalidade para todos
Eu não tenho boa preparação física. Na mesma posso fazer Muay Thai?
Qualquer pessoa pode praticar Muay Thai, desde que tenha espírito de sacrifício. Todos os dias levas o teu corpo ao limite e tens de ter vontade de superar-te.
Há muita gente que te procura para treinos de preparação física e que não são atletas de Muay Thai nem querem ser, como surfistas. Porquê?
Pela preparação física que o Muay Thai traz, pelo meu método de treino com foco na resistência muscular e não na hipertrofia e porque veem os resultados nos meus alunos.
Tens uma treinadora auxiliar muito especial...
Tenho uma cadela Dobermann que é a Pinky que me acompanha a mim e aos meus alunos. Quando eles vão correr para a praia levam a cadela.
A Pinky está na Escola desde os dois meses de idade. Muitas vezes estamos a saltar à corda e a dar low kicks e ela está a dormir mas quando vamos para a praia, torna-se engraçado! Ela puxa pela malta!
Ela puxa o pneu de uma mota ao mesmo tempo que nós fazemos sprints e compete connosco. Às vezes ganha a Pinky! Ela atropela e faz placagens à malta que entra na brincadeira dela.